Pesquisar este blog

sábado, 15 de agosto de 2015

Acompanhamento nutricional de pacientes com Síndrome de Down atendidos em um consultório pediátrico



Nutritional monitoring of Down Syndrome patients assisted by a pediatric clinic La supervisión nutricional de los pacientes con Síndrome de Down asistidos por una clínica pediátrica
                                              Milena Biazi Prado*                                                                         Vera Silvia Frangella**
                                             Luciana Mestrinheri*                                                                              Zan Mustacchi***
ReSumo: A Síndrome de Down (SD) é uma condição genética que compreende aproximadamente 18% da população com comprometimento intelectual. Anualmente afeta cerca de 8 mil bebês brasileiros. Apresentam uma variedade de complicações tornando-os mais vulneráveis ao aparecimento de doenças. A inexistência de parâmetros antropométricos específicos e nacionais para todas as idades dificulta a avaliação do desenvolvimento pôndero-estatural, identificação de fatores de risco e prescrição adequada da terapia nutricional a essa população. Esse trabalho visou a definir o perfil antropométrico comparando-se resultados obtidos pelo emprego de dois padrões de referência indicados para classificar o estado nutricional de indivíduos com SD. Esta pesquisa avaliou 350 crianças com SD, de ambos os gêneros, com idades entre 0 e 11 anos, atendidas em uma clínica pediátrica de São Paulo, a partir da coleta de dados registrados em prontuários. Determinou-se o diagnóstico nutricional de acordo com as curvas de crescimento propostas por dois padrões de referência. A maioria das variáveis antropométricas, pelos dois padrões, foram superiores no gênero masculino. Considerando-se peso e estatura/idade percebeu-se que, utilizando-se o padrão internacional, encontram-se mais indivíduos eutróficos. Comparando-se os resultados obtidos com o emprego dos dois padrões de referência, a classificação de déficit de peso e de baixa estatura para idade segundo padrão nacional resultou em 2 vezes mais baixo peso e baixa estatura. Novos estudos contemplando curvas de peso/estatura, Índice de Massa Corporal, dobras e perímetros são necessários para maior precisão no diagnóstico nutricional. A avaliação e intervenção nutricional são fundamentais para garantir longevidade com qualidade.
PALAvRAS-chAve: Síndrome de Down. Antropometria. Avaliação Nutricional.
Abstract: Down Syndrome (DS) is a genetic condition that affects about 18% of the population with intellectual compromising. Annually it affects about 8 thousand Brazilian babies. These babies present a variety of complications that makes them more vulnerable to diseases. The inexistence of specific and national anthropometric parameters for all ages makes it difficult to evaluate weight and stature development, identify risk factors and adequately choosing nutritional therapy to this population. This work aims to define these patients anthropometric profile comparing results of two sets of reference parameters used for classifying the nutritional condition of individuals with DS. This research evaluated 350 children with DS, both female and male, with ages from 0 to 11 years assisted by a pediatric clinic from São Paulo City on the basis of data registered in clinical histories. Nutritional diagnosis was determined according growth curves proposed by two sets of reference parameters. Most anthropometric variables presented higher values for male subjects in both reference parameters. Considering weight and stature/age, we perceived that the use of the international standard reveals a greater number of euthrophic individuals. Comparing results of the two standards, the classification of weight deficit and low stature correlated to age according to Brazil’s standard revealed a double percentage of lower weight and low stature subjects. New studies on weight / stature curves, Body Mass Index, folds and perimeters are necessary for higher precision in nutritional diagnosis. Nutritional evaluation and intervention are vital to guarantee longevity with quality.
KeywoRDS: Down Syndrome. Anthropometry. Nutrition Assessment.
Resumen: La Síndrome de Down (SD) es una condición genética que afecta unos 18% de la población con comprometimiento intelectual. Afecta anualmente unos 8 mil bebés brasileños. Estos bebés presentan una variedad de complicaciones que los hacen más vulnerables a enfermedades. La inexistencia de parámetros antropométricos específicos y nacionales para todas las edades hace difícil evaluar el peso y el desarrollo de la estatura, identificar factores de riesgo y elegir terapias nutricionales adecuadas a esta población. Este trabajo apunta definir el perfil antropométrico de estos pacientes comparando resultados de dos sistemas de parámetros de referencia usados para clasificar la condición nutricional de individuos con la SD. Esta investigación evaluó a 350 niños con SD, hembras y varónes, con edades desde 0 hasta 11 años asistidos por una clínica pediátrica de la ciudad de São Paulo en base de los datos registrados en históricos clínicas. Se hizo la diagnosis nutricional según curvas de crecimiento propuestas por dos sistemas de parámetros de referencia. La mayoría de las variables antropométricas presentaron valores más altos para los sujetos masculinos en ambos parámetros de referencia. Considerando el peso y la estatura/edad, percibimos que el uso del estándar internacional revela un mayor número de individuos eutróficos. Comparando resultados de los dos estándares, la clasificación del déficit del peso y baja estatura por edad, según el estándar del Brasil revela un porcentaje doble de sujetos con peso más bajo y baja estatura. Nuevos estudios de curvas de peso/estatura, índice de masa corporal, doblas y perímetros son necesarios para una mayor precisión en diagnosis nutricional. La evaluación y la intervención nutricionales son vitales como para garantizar longevidad con calidad.
PALAbRAS LLAve: Síndrome de Down. Antropometría. Evaluación Nutricional.
* Pós-graduandas em Síndrome de Down pelo Centro de Estudos e Pesquisas Clínicas de São Paulo – CEPEC-SP – Universidade Mogi das Cruzes – UMC. 
Nutricionistas pelo Centro Universitário São Camilo. E-mail: milena_nutri@yahoo.com.br
** Nutricionista. Mestre em Gerontologia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Especialista em Administração Hospitalar pela Faculdade de Saúde Pública de São Paulo. Especialista em Terapia Nutricional Enteral e Parenteral pela Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral. Especialista em Nutrição Clínica pela Associação Brasileira de Nutrição. Docente do Curso de Graduação e Pós Graduação do Centro Universitário São Camilo.
*** Médico Geneticista, Pediatra. Pós-doutor pela Universidade de São Paulo. Doutor e Mestre em Farmácia (Análises Clínicas) pela Universidade de São Paulo.
Especialista em Medicina Tropical pela Universidade de São Paulo. Especialista em Homeopatia pela Sociedade Brasileira de Homeopatia. Especialista em Administração Hospitalar pelo Instituto Militar de Administração. Especialista em Pediatria pela Sociedade Brasileira de Pediatria e Aperfeiçoamento em Atenção Clínica à Síndrome de Down pela Institute Progenese (França). Coordenador e Docente do Curso de Especialização em Síndrome de Down.

Introdução

A Síndrome de Down (SD) é um distúrbio genético e metabólico, no qual ocorre uma alteração cromossômica, que pode ser de três tipos: 1) trissomia 21 (presença e expressão de três cópias de genes localizados no cromossomo 21 a partir de uma falha na separação desse cromossomo durante a meiose, por não-disjunção), prevalente na maioria dos casos (aproximadamente 95%); 2) translocação (o material cromossômico extra fica aderido a outro cromossomo, e o paciente tem 46 cromossomos), representa cerca de 3% dos casos; ou 3) mosaicismo (o comportamento se assemelha a não disjunção como uma tentativa de correção do processo, porém compromete apenas um grupo das células, algumas têm 47 e outras 46 cromossomos), encontrado em aproximadamente 2%
dos casos diagnosticados41,20,37,2,13.
É a primeira síndrome definida clinicamente como de origem cromossômica, reconhecida há mais de um século por John Langdon Down, que constitui uma das causas mais frequentes de deficiência mental (DM), compreendendo aproximadamente 18% dos casos atendidos em instituições especializadas30,26. Afeta 1 a cada 800 recém-nascidos em todo o mundo e é o principal fator genético no desenvolvimento de deficiência intelectual. No Brasil, nascem cerca de 8 mil por ano com SD, sendo a alteração genética mais diagnosticada na clínica pediátrica34,27.
Devido à melhoria nos cuidados familiares, médicos e de reabilitação na infância, sua expectativa de vida tem aumentado nos últimos anos. Considera-se que mais de 60% desta população viverá mais que 50 anos, 44% chegarão aos 60 anos e 14% aos 68 anos38,8.
Normalmente é diagnosticada no nascimento por combinações específicas de sinais, como face achatada, nariz pequeno e achatado, pele abundante no pescoço, hipotonia muscular, baixa estatura, entre outras. Apesar de ser facilmente identificada ao exame clínico, se necessário, realiza-se análise cromossômica para confirmar seu diagnóstico, a fim de se avaliar as implicações genéticas para a família44,38. Problemas durante a gestação como crises emocionais, traumas mecânicos ou o uso de drogas não são causadores dessa alteração, pois é de natureza genética13.
Segundo Freeman, et al14, embora a idade materna avançada seja um fator de risco para o surgimento da SD, são necessários mais estudos a esse respeito. A questão da idade fisiológica do ovário é mais importante, pois há relevância clínica e biológica. Se a depleção do óvulo com idade avançada é base do efeito da idade maternal, então mulheres com um número reduzido de óvulos, por outras razões, podem ter o risco aumentado de concepção com trissomia 21. Assim, mulheres com apenas um ovário intacto, causado por cirurgia ou anormalidades congênitas, devem realizar teste para anormalidades cromossômicas. Já o estudo realizado por Binkert, et al3, indicou correlação positiva entre a idade avançada da mãe e o risco para o nascimento de uma criança com SD, embora não esclarecesse adequadamente o mecanismo3.
A SD pode ser associada com uma variedade de complicações e comprometimento: do coração, sistema nervoso, da visão, medula, glândula tireóide, arcada dentária, dos pulmões, do fígado, estômago, pâncreas, rins e glândula suprarrenal, da vesícula biliar, do intestino delgado e grosso, das articulações do joelho, do quadril, entre outros. A síntese excessiva da multiplicação de produtos de genes derivados do excesso de expressão dos genes presentes no cromossomo 21 é um fator para características dismórficas e doenças neurológicas, imunológicas, endócrinas e bioquímicas próprias da SD23,33,37.
Estudos da última década classificam a SD como alteração progeróide, indicando seu processo de envelhecimento antecipado, como responsável pelo aparecimento de alterações imunológicas, auto-imunes e endócrinas, entre outras, em faixa etária precoce quando comparados à população geral39,25.
Cerca de metade das crianças com SD (40%-50%) possuem má formação congênita, especialmente do coração, constituindo sua mais importante causa de morte19,42. Aproximadamente 5% têm anormalidades gastrintestinais; além de terem risco aumentado em 15 a 20 vezes para aparecimento de mielodisplasia transitória e 10 a 30 vezes mais riscos para desenvolverem leucemia quando comparadas à população em geral. Doenças imunológicas, doença celíaca, disfunção tireoidiana e diabetes, também são prevalentes. Contudo, são necessários novos estudos sobre o genoma do cromossomo 21 para verificar o mecanismo pelo qual a SD confere suscetibilidade a doenças endócrinas37,5,49,47.
A doença de Alzheimer aparece como a mais importante causa de morbidade e mortalidade entre as pessoas com SD de idade mais avançada. A presença de outras anormalidades cerebrais é mais
rara8,12.
Esses indivíduos, portanto, apresentam características metabólicas que os tornam mais vulneráveis ao aparecimento de doenças relacionadas principalmente ao seu estado nutricional. Dessa forma, a aplicação de métodos adequados para a avaliação nutricional dessa população é de extrema importância para lhes garantir a manutenção da saúde, pois fornece subsídios para: avaliar a presença de riscos para desenvolver doenças e implementar adequada intervenção nutricional. A antropometria é o método mais empregado para a avaliação do estado nutricional. Consiste na avaliação das dimensões físicas e da composição global do corpo humano, como tamanho e proporções e contribui para o diagnóstico nutricional em nível populacional, pela facilidade de execução e inocuidade. Além disso, é de baixo custo, sendo um método aceito e aplicado universalmente. Permite a obtenção de muitas informações valiosas para o adequado cuidado nutricional e clínico do indivíduo. O peso, a estatura, suas combinações e dobras cutâneas são os indicadores e parâmetros antropométricos mais utilizados em estudos epidemiológicos17,32,1,40.
A avaliação do crescimento e desenvolvimento de crianças verifica se o ganho ponderal e de estatura/comprimento está atendendo aos requisitos plenos do seu potencial genético. Com esta finalidade, foram criadas curvas de acompanhamento pôndero-estatural que possuem como referência indivíduos considerados comuns, ou seja, que vivem em condições socioeconômicas, culturais e ambientais satisfatórias e que lhes permitam atingir seus potenciais plenos de crescimento e desenvolvimento. A interpretação das medidas antropométricas exige o uso de padrões de referência e pontos de corte
definidos45,46.
A inexistência de figuras e tabelas com variáveis antropométricas de indivíduos com SD para todas as idades na população brasileira dificulta a caracterização clínica e avaliação do seu desenvolvimento pôndero-estatural, pois faz com que profissionais envolvidos no seu acompanhamento utilizem curvas de outros países as quais sofrem interferência de fatores ambientais de ordem: social, cultural e genética. É necessário o acompanhamento periódico, pois existem características específicas que devem ser consideradas por todos os profissionais envolvidos no tratamento dos indivíduos, como o Nutricionista, que é responsável pela orientação nutricional e prescrição da dieta adequada às necessidades específicas e individualizada31.
Com um bom acompanhamento nutricional a obesidade e outras doenças comumente associadas à SD podem ser prevenidas. A terapia nutricional deve, portanto, ser individual, baseada em dados clínicos e laboratoriais, pois hábitos nutricionais definidos por erros dietéticos são os principais fatores do desenvolvimento de obesidade nesta população32.
Esta pesquisa apresenta informações sobre o diagnóstico nutricional baseado em medidas antropométricas de pacientes com SD a partir de diferentes curvas usadas pela comunidade científica, com a finalidade de mostrar a importância do diagnóstico nutricional na garantia da saúde e adequação de seus cuidados. Pretende-se obter dados mais específicos sobre essa população, com a finalidade de desafiar a ciência à busca de novas descobertas, incentivando o desenvolvimento de novos projetos para crescente benefício da saúde da sociedade em geral. objetivos
Este estudo teve por objetivos definir o perfil antropométrico de pacientes com SD a partir da coleta de dados de registros em prontuários, obtidos em consultas médicas de rotina, e comparar com os padrões de curvas já existentes, segundo parâmetros de Mustacchi31 e Cronk, et al9, para definir o estado nutricional dessa população.

material e métodos

Esta pesquisa foi aprovada pelo
Comitê de Ética e Pesquisa (COEP), do Centro Universitário São
Camilo, sob o parecer de número 003/06, caracterizando-se como um estudo de campo de observação, longitudinal e retrospectivo. Foi desenvolvida no Centro de Estudos e Pesquisas Clínicas de São Paulo (CEPEC-SP), localizado no bairro Morumbi, na cidade de São Paulo, no período de janeiro a novembro de 2008. A coleta de dados deu-se por meio de registros de dados em prontuários, obtidos em consultas de rotina de pacientes com SD, atendidos pelo Doutor Zan Mustacchi, em seu consultório particular que compõe o CEPEC. Participaram do estudo somente os pacientes autorizados pelo doutor, após a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. O número total da amostra foi representada por um total de 606 crianças de ambos os gêneros, com SD e atendidas no CEPEC, com idades de 3 dias até 12 anos.
A amostra da primeira parte dessa pesquisa, denominada A, foi definida pelos seguintes critérios de inclusão: crianças, com a faixa etária de até 12 anos, de ambos gêneros, com diagnóstico comprovado de SD e doenças associadas, exceto Insuficiência Cardíaca Congestiva (ICC), devido a possível formação de edema e alteração do peso corporal, o que compromete os valores da antropometria e, consequentemente, interfere na confiabilidade do diagnóstico nutricional. Para a composição da amostra da segunda parte desse estudo (B), excluíramse os participantes menores de um mês de idade, para atender aos critérios estabelecidos pelas curvas de Cronk, et al9; maiores de 8 anos, pois Mustacchi31 estabelece curvas até essa faixa etária; crianças que tiveram somente uma consulta médica e/ou as que não tinham registro em prontuário de valores de peso, estatura ou perímetro cefálico, por impossibilitar a comparação dos resultados entre a primeira e a última consulta, interferindo na avaliação da evolução nutricional da clientela atendida.
Após a autorização formal do médico responsável iniciou-se a pesquisa, com coleta dos seguintes dados registrados em prontuário: iniciais do nome do paciente; gênero; classificação social; diagnóstico de base e associados, datas de nascimento e das consultas; valores de peso, estatura e perímetro cefálico.


Nenhum comentário:

Postar um comentário